sexta-feira, 29 de abril de 2016

Proposta de Emenda Constitucional transforma EIA/RIMA em Licenciamento Ambiental

A Comissão de Justiça do Senado aprovou dia 27/04/2016 a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 65/2012, alterando o artigo 225 da Constituição federal. Segundo os autores, o objetivo é combater o desperdício de recursos públicos com obras inacabadas, uma vez que, se aprovada no Plenário do Senado, haverá uma vedação da suspensão ou cancelamento da execução de obras cujo estudo prévio de impacto ambiental tenha sido apresentado e aprovado.

Quero aqui tentar traduzir essa alteração da legislação ambiental tão repercutida nos últimos dias.

O tão comentado "parágrafo 7º" à ser incluído ao artigo 225 da Constituição diz o seguinte:

"§ 7º A apresentação do estudo prévio de impacto ambiental importa autorização para a execução da obra, que não poderá ser suspensa ou cancelada pelas mesmas razões a não ser em face de fato superveniente."

(Vide íntegra da PEC)


Ao meu ver:

1) O EIA/RIMA passa a a ter a mesma força das Licenças Prévia (LP) e de Instalação (LI), dispensando-as;

2) De acordo com o sítio do Senado, a Proposta é direcionada às obras públicas que são interrompidas judicialmente por opositores sucessores dos cargos do Executivo (prefeitos, governadores e presidente); porém, conforme observa-se acima na transcrição do tal "parágrafo sétimo", não há menção alguma que tal determinação tenha como objetivo apenas as obras públicas, portanto se assim for aprovado, nada impedirá que obras privadas recorram ao mesmo artifício.

3) A alegação de "evitar interrupção de obra para combater desperdício público" não pode ser usada para isentar quaisquer obras do licenciamento ambiental e instaurar o EIA/RIMA em seu lugar, uma vez que este é apenas o resultado de um estudo que demonstra quais serão os impactos ambientais, sociais e etc. que decorrerão da obra e quais serão as atitudes mitigadoras, enquanto que o licenciamento é um instrumento que certifica a regularidade daqueles documentos, se as etapas de implantação do projeto estão de acordo com o previsto; assim somente haveria prejuízo ao erário caso sua realização estiver superfaturada, assunto este não abarcado pelo Direito Ambiental;

4) Mencionar que a obra não pode ser suspensa ou cancelada pelas mesmas razões (que a originou) é absolutamente dispensável. Partindo-se do princípio de que ela foi aprovada em todos os âmbitos, não haveria o porquê de tudo ser revisto, exceto por erro de projeto não observado em sua concepção e que cujo prosseguimento coloque em risco o meio ambiente, a comunidade e etc., ocorrências tais que estamos considerando como "fatos supervenientes", mesmo porque caso tais riscos sejam detectados, certamente seria paralisada com base em outras legislações.

5) Além dos motivos de risco à saúde e/ou ao patrimônio público e ambiental, com certeza a obra poderá ser paralisada por suspeita de crimes de responsabilidade, improbidade ou de corrupção, e nestes casos não se pode confundir Direito Ambiental e Direito Penal. E se o sucessor político paralisar uma obra com intuito protelatório, há outros remédios legais para isto.

Em síntese: Absolutamente desnecessária esta Emenda Constitucional do ponto de vista de desperdício do erário, mas altamente perigosa do ponto de vista ambiental. Ela permitirá que métodos "escabrosos" não tenham freios legais e, ao contrário do que se alega, os cofres públicos poderão sofrer muito mais vazamentos, haja visto que uma obra não poderá ser embargada caso ela esteja sendo implementada de forma ineficiente, ineficaz e de forma espúria.

Nossos políticos brasileiros são capazes de produzir tanta ambiguidade em tão poucas palavras, sem falar no tempo absurdo perdido em algo que poderia ser resolvido por outros meios. Obviamente que tudo isto tem apenas uma finalidade...

Um abraço à todos...

quarta-feira, 13 de abril de 2016

É estarrecedor saber que o Ministério do Meio Ambiente possuía as informações sobre um possível desastre 5 anos dele ocorrer. E nada fez...

Por questões pessoais estive durante estes dias estudando a versão preliminar do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, uma das exigências da Lei 12.305/2010 que estabeleceu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. O item 1.8 do plano, que fala sobre Resíduos Sólidos de Mineração, fez com que a imagem do mar de lama da barragem rompida em Mariana/MG viesse à mente e aquela pequena chama de indignação adormecida voltasse a arder mais forte.

No mencionado item 1.8 do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, entregue preliminarmente em 2011, consta o seguinte:


"A disposição de rejeitos de mineração em barragens é o método mais comumente usado no país. [...] Barragens de rejeitos apresentam um sério risco se não forem adequadamente planejadas, operadas e mantidas. Em 2009 o estado de Minas Gerais possuía 600 barragens, sendo 500 do setor de mineração. Segundo a Fundação Estadual do Meio Ambiente existiam nessa época 62 barragens de rejeitos e resíduos [...] que apresentavam risco e necessitavam de intervenções para melhorar a estabilidade. A importância do tema é de tal ordem que em 2010 foi sancionada a Lei nº 12.334 que estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens."


É estarrecedor saber que o Ministério do Meio Ambiente possuía as informações sobre um possível desastre 5 anos dele ocorrer. E nada fez...

A implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos vem sendo prorrogada infinitamente: Além de 36% dos lixões no país ainda não terem sido desativados, o Ministério do Meio Ambiente sequer entregou seu próprio Plano Nacional e toda essa procrastinação do próprio governo retarda uma melhor visão sistêmica e controle da questão, além de ensejar a mesma leniência por parte dos municípios em confeccionar seus próprios planos. O que dizer então sobre a vontade dos prefeitos em implantar aterros sanitários? O exemplo vem de cima...

Toda essa preguiça política reflete em situações como a da Samarco e seu desastre ecológico. Pagar pelo crime, de certo que eles pagarão, o grupo é bilionário e já iniciou obras de recuperação, mas as mortes humanas não têm preço; o desequilíbrio ecossistêmico não pode ser pago; o dinheiro talvez possa recuperar as áreas degradadas mas não trará à vida a fauna e a flora dizimadas pelo mar de lama; como quantificar o valor das pessoas e animais desabrigados, o horror vivido e a dor sofrida? E a impossibilidade de usufruir um corpo hídrico completamente contaminado, seja para dessedentação, para a pesca ou para o lazer, pode-se mensurar financeiramente?

Mas este é o país do futuro. Talvez por isso o plano ainda não foi definitivamente entregue, a Samarco não foi notificada à tempo de evitar o desastre e os lixões ainda persistem em existir... Fica tudo para o futuro.


Um abraço à todos.



Link:

Plano Nacional de Resíduos Sólidos (versão preliminar)